segunda-feira, 9 de novembro de 2009

Não Deixe a Vida Passar...


Olhando o fogo que crepita na lareira de minha enorme casa, enrolado no cobertor, faço um balanço do que transformei o meu triste viver.
Tudo começou quando conheci uma linda menina que desabrochava para a vida. Mariana era linda, alegre, cheia de graça e entusiasmo... Fiz-lhe todas as promessas e depois a abandonei miseravelmente. No momento eu não me sentia pronto para o casamento, queria curtir, me divertir viajar estudar...
Deixei nosso romance esfriar, fui franco com ela. Queria ser livre para me divertir, não poderia ficar preso a uma só mulher... Disse-lhe tudo e fiquei esperando sua reação!!! Ela não disse nada. Levantou seus lindos olhos verdes marejados de lágrimas... Sorriu pra mim e partiu batendo de leve com a porta. Neste exato momento, compreendi que minha vida não seria mais a mesma...
Se eu havia proposto a separação, porque meu coração estava tão sufocado? Porque meu desejo era sair gritando e chamando-a??? O coração tem razões que a própria razão desconhece...
Passaram-se os dias e minha alegria não voltava, então resolvi telefonar para ela. Ninguém atendeu... Agora já tinha uma certeza: Eu não poderia viver sem ela, ela era a razão do meu viver. Mas o orgulho e a vaidade me impediram... Hoje vejo que estes dois monstros, orgulho e vaidade, não são maiores que o amor...
Nunca mais a vi. Hoje me pergunto: porque não a chamei porque deixei que o orgulho falasse mais alto?
Passaram-se quarenta anos... Deixei minha vida esvair-se dia após dia, hora após hora, esperando que ela adentrasse minha porta e enchesse minha vida de alegria.
Minha espera foi vã. Fiquei sabendo por outros que ela mudara de cidade, refizera seus planos. Mariana era uma moça decidida.
Eu passei o resto de minha vida vivendo o sonho de estar com ela. Seu retrato ainda está na minha cabeceira, sorrindo para mim... Neste momento eu a sinto somente minha. Todos estes anos vivi como pude, tive casos, novas amizades, vi coroado de êxito meu trabalho, me tornei abonado. Tudo isso para que? Se a razão par todo meu sucesso seria ela? Vejo enrugada minha pele e brancos meus cabelos e uma vontade imensa de ser feliz. Meu amor está lá, cristalizado no passado... Preciso fazer com que ela me escute. Ajude quem puder ajudar!!! Mas quem pode me ajudar, se eu mesmo deixei minha vida esvair-se, não quis assumir o compromisso, que fui covarde na hora da tomada de decisão??? O que restou de mim foi este imenso e amargo vazio, que levarei até a ultima hora. Viver num sonho a esperança de um amor total e absoluto... Que ficou no passado! E a vida não volta pra trás... Fiz de minha vida uma quimera. Só resta esperar minha hora de partir deste mundo!!! Com as mãos vazias e um gosto amargo na boca! Me culpo por ter desperdiçado meu tempo na Terra. Quem vai chorar por mim? Que vida levei! Fui ator e espectador de minha triste história...
Aviso a todos, não perca a oportunidade, não deixe o hoje pelo ontem! Sorvam a vida como um doce cafezinho numa tarde fria de inverno, bem devagarinho.
Solto uma gargalhada, entrecortada de soluços, vivi quarenta anos atrás de um sonho. Nele fui feliz até despertar esta manhã e já me sentir morto, porque o que me fez viver foi o sonho e, ao acordar de meu sonho, descubro que acordo para morte...

sábado, 7 de novembro de 2009

o Barco



Marília na doce ingenuidade de criança resolveu que iria fazer um barco de chicletes.
Sonhava todo dia que navegaria com seu barquinho desde o pequeno córrego que passava no fundo do quintal de sua casa até fazer a volta ao mundo... Porque o córrego encontra o rio depois o mar! A professora havia explicado. Como seria bom, pensava... De dia, ela remaria, observaria as maravilhas da paisagem e anotaria tudinho no seu caderno de notas. De noite, dormiria observando as estrelas... Sim porque seu barco de chicletes flutuaria sozinho!!! Contaria as estrelas todas as noites para ver até quantas, contaria até chegar de volta à casa... Sim, porque seu barquinho lhe traria de volta, cheia de novidades lindas para seus parentes e amigos!!! Seu barquinho seria seguro.
Mas havia um problema: Teria que juntar muito chiclete para fazer seu sonhado barco. “Mãos à obra”, pensou! Todas as festas: aniversário, Natal, Páscoa, sempre pediria como presentes: CHICLETES!!! Iniciou seu plano! Foi ver o córrego de perto. Atirou uma pedra. A água fez vários círculos até a pedra desaparecer. “Puxa, é bem fundo. Vou precisar de um barco bem grande para não afundar!!!” Pensou Marília. Todos os dias examinava o tamanho da bola de chicletes que havia juntado. Virava devagarzinho o encosto da cama e, lá estava uma bolona, que era uma relíquia, para ela, a cristalização de seu sonho!!! Mas faltava muito ainda nem dava para encher suas duas mãozinhas... Os pais estavam intrigados! Pra que tanto chiclete? O que a menina pretendia? Ela não falava nada! Seria uma grande surpresa!

Certo dia ao chegar da escola, a casa estava um caos! Era água por todo lado. Perguntou: “O que é isso?” Sua mãe respondeu: “É faxina! Vamos receber sua tia, já arrumamos o quarto, irás dormir com tua prima.” Seu coraçãozinho apertou, correu desesperada até o quarto, com as mãozinhas nervosas procurava ansiosamente pelo seu tesouro! Ouviu uma voz ecoando seu nome: “Saia já daí! Vai se molhar e sujar o uniforme! Vá já cuidar de sua irmãzinha!!”. “Eu queria...” balbuciou. “Queria nada, saia já daí senão vou te buscar...” Marilia sabia como seria! a vara verde listaria suas nádegas. Saiu chorando. “Mãe, minha bola...” “O que?” Respondeu a mãe? “Aquele nojo? botei fora!” Nunca, ninguém saberia jamais, que haviam destruído uma parte de seu coraçãozinho!!! Chorou muito até cansar. Sua cabecinha não entendia porque era nojenta sua bola de chicletes??? Que mundo triste este dos adultos. Decididamente, não queria crescer! Queria morrer! Não quero pertencer a este mundo horrível, onde só pensam em trabalho, obrigações, horários. Queria um mundo onde se pudesse sonhar. Ser livre... Nunca mais falaria em chicletes nem mais sonharia com barco. Marília nunca mais foi a mesma. Mataram seu sonho de menina. Era melhor crescer... Foi assim que Marília deixou de ser criança, aprendeu que as crianças têm que ser subordinadas aos adultos, que sem nenhuma explicação lhe arrancam do peito as mais lindas ilusões...

Porque os adultos fazem isso???

contos

Resolvi postar alguns contos que escrevi, para variar um pouco a minha linha de postagens. São contos despretenciosos, mas que fomentam discussões bem variadas...